terça-feira, 3 de agosto de 2010

Adnalva ganha liberdade


Após cinco dias de angústia em uma cela de delegacia, a doméstica Adnalva Maurício de Souza ganhou a tão desejada liberdade. O alvará de soltura foi expedido pela juíza Daniela Guimarães, da 1ª Vara de Tóxicos, às 22 horas de anteontem, mas a liberdade só foi concedida no início da tarde de ontem.
“Demos entrada no pedido de fiança na Justiça. Conversei com a juíza sobre a situação dela. A juíza pegou o auto de prisão em flagrante e no próprio auto, concedeu na mesma noite, a liberdade provisória para dona Adnalva”, explicou a advogada Karina Araújo, que aguardou durante a manhã um oficial da Justiça para o cumprimento da decisão judicial.
Adnalva teve imagens de sua prisão exibidas nacionalmente, após um flagrante forjado feito por policiais militares da 14ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM). Ela foi detida sob acusação de ter tentado subornar policiais com cerca de R$ 500, com o objetivo de libertar o filho preso na 5ª Delegacia, por tráfico de drogas.
A equipe da Tribuna acompanhou, com exclusividade, os passos de dona Adnalva, da saída de delegacia ao encontro com a família. Acompanhada pela advogada Karina Araújo, Adnalva deixou as carceragens da 9ª Delegacia no início da tarde. Nas mãos, ela carregava uma pequena sacola contendo o remédio usado para controlar um problema respiratório e algumas peças de roupas, que ela não sabia de quem eram. Ao sair da cela, Adnalva contou que recebeu mensagens de boa sorte das outras detentas.
“Elas perceberam que eu sou uma pessoa de bem e ficaram com pena de mim. Quando saí, elas pediram o pacote de absorvente que eu tinha e as minhas merendas, que minha filha tinha trazido. Dei tudo, só não dei as roupas porque não são minhas. Nem sei de quem é. Não faço questão de nada, se eu tiver apenas um prato de comida dentro de casa, quem chegar eu divido. Sou uma pessoa que ajudo todo mundo”, afirmou.
Na porta da delegacia, a servente, que trajava um simples vestido azul, se emocionou ao rever a rua, após cinco dias de prisão e chorou ao falar sobre o filho preso. Para ela, a felicidade em ter ganhado liberdade não é maior devido à situação de Erisvaldo. “Estou muito feliz em ter saído da delegacia, mas só vou descansar e ter paz nessa vida quando tiver meu filho de volta e puder abraçar ele sem ser dividida por uma grade”, disse sob lágrimas.
Erisvaldo Souza dos Santos, 19 anos, mais velho entre os quatro filhos da servente, foi preso com drogas dentro de casa, localizada no bairro do Lobato.

GRAVAÇÃO - A prisão de Adnalva ocorreu após ela ter chegado à unidade policial com o dinheiro em mãos, acreditando que ele seria usado para acelerar a liberdade do filho. Ela relata que recebeu um telefonema do filho e de uma pessoa que seria policial, pedindo o dinheiro. Desesperada, com a ajuda de pessoas do bairro, conseguiu completar o valor pedido. Segundo ela, parte do dinheiro entregue aos policiais seria para comprar o enxoval do próximo neto que vai nascer.
Enquanto tomava o caminho de volta para a casa de familiares, a mulher contou sobre a difícil trajetória percorrida para sustentar os quatro filhos, a nora, grávida de sete meses e o neto, de apenas 3 anos.
“Conheci o pai dos meus filhos quando tinha 14 anos de idade. Aos 16, engravidei e dei a luz a Erisvaldo. Compramos uma pequena casinha de taipa em Mirantes de Periperi e construímos com muita dificuldade. Fui para Feira de Santana, comprei roupas para revender e criei meus filhos dessa forma”, contou. Quando nasceu o quarto filho, hoje com 16 anos, o casal se separou e Adnalva passou a morar de aluguel e sustentar a casa com o dinheiro ganho em faxinas.
Junto à família, mas despejada de casa
A todo o momento Adnalva repetia o desejo de ver o filho livre da cadeia. Desesperada, ela afirmou que se ele for para a detenção, ela coloca fim na própria vida. “Não conseguiria viver sem ele”, afirmou. E o drama desta mãe, além de enfrentar a realidade de ter o filho envolvido com o mundo das drogas, agora é buscar um novo abrigo. Devido à exposição na mídia, com imagens do suposto flagrante policial veiculadas nacionalmente, Adnalva foi despejada do imóvel que morava no Lobato e não tem onde morar com filhos e netos. O dono do imóvel informou que aguarda que a família retire seus pertences.
Dona Adnalva disse que teme qualquer tipo de represália, pois seu endereço já é conhecido e afirmou que não pretende continuar no mesmo bairro. Na tarde de ontem, pediu para ser levada pela advogada ao encontro da irmã, que mora no Rio Sena, pois não tinha dinheiro de transporte. No percurso, a reportagem acompanhou a expectativa da doméstica.
As lágrimas, que segundo ela, rolaram durante toda esta semana, não puderam ser contidas ao avistar as filhas e a irmã, que a esperavam na rua. “Minha filha, obrigado Senhor!”, gritava. Moradores do local saíram para as varandas e acompanharam o emocionante encontro da doméstica com a família. “Quero meu filho meu Deus! Só vou descansar quando ele estiver aqui comigo. Nunca sofri tanto na minha vida, nem mesmo com a morte da minha mãe”, disse sob lágrimas. Emocionadas as filhas tentaram acalmar a mãe e a conduziram até a residência.
Adnalva seguiu com a única certeza que foi vítima de uma “armação” e que agora precisa recomeçar a vida. “Espero que o que aconteceu não dificulte para eu arranjar emprego. Preciso trabalhar”, afirmou.
MEDO – A família da servente está temerosa com os desdobramentos desse caso. Parentes afirmaram que Erisvaldo estaria sendo ameaçado na cadeia, caso Adnalva continuasse dando declarações sobre o ocorrido. Segundo um parente do acusado, um dos militares envolvidos na filmagem que resultou na prisão da doméstica, também é morador do Rio Sena. “Eles ligaram para minha casa e disseram que se a gente continuar falando vai piorar a situação de Erisvaldo. Estamos com medo do que pode acontecer”, afirmou uma prima, que preferiu não se identificar.
A reportagem da Tribuna, após três dias de tentativas, conseguiu contato telefônico com a Polícia Militar. O capitão Marcelo Pita, assessor do Departamento de Comunicação Social da PM, disse que não tem nada a declarar sobre o caso. (DP)

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